Por Juliana Santiago
“O fantasma da ópera“, livro escrito pelo francês Gaston Leroux e publicado em 1910, narra uma história repleta de suspense, drama e romance, que inspirou diversas adaptações no teatro e no cinema, tendo uma enorme importância para a literatura gótica. O autor, por ser jornalista, se utilizou de sua profissão para dar um teor de relato não ficcional à obra literária; em seu prefácio, afirma que o Fantasma da Ópera, personagem em torno do qual gira toda a história e que será o responsável pelos mistérios ocorridos nela, realmente existiu, comprovando a veracidade com supostos documentos, além de inserir relatos de diversas pessoas que presenciaram os estranhos fenômenos. Isso tudo contribuiu para que houvesse uma impressionante verossimilhança na narrativa.
A história se passa no século XIX, na Ópera de Paris, e começa no momento em que os personagens Debienne e Poligny, que dirigiam o teatro, estão em seu último dia no local, se despedindo e se aposentando para dar lugar aos novos diretores, Moncharmin e Richard. No entanto, uma trágica e curiosa morte ocorre durante seus discursos, e logo o pessoal do teatro a atribui ao “Fantasma da Ópera” – um ser misterioso o qual acreditavam realmente que fosse um fantasma, já que ele morava no teatro e, mesmo assim, nunca tinha sido visto por ninguém, apenas haviam escutado a sua voz, descrita como incrivelmente bela. Essa morte será apenas um dos muitos acontecimentos bizarros que serão narrados ao longo do livro.
No meio de todo o caos, alterna-se para o ponto de vista de Raoul, o visconde de Chagny, completamente apaixonado por Christine Daaé, uma cantora da Ópera que costumava ser sua amiga de infância. Ele tenta uma reaproximação, mas ela o evita a todo instante e até chega a fingir que não se lembra do rapaz. Porém, ele não desiste de conseguir sua atenção, e um dia em que tinha decidido falar com Christine em seu camarim, ele escuta a voz de um homem, parecendo ser seu amante. Frustrado e confuso, Raoul tenta mais uma vez conversar com a moça a fim de se declarar e saber o que ela realmente sente por ele, e acaba descobrindo que ela está recebendo aulas de canto do “Anjo da Música”, que, segundo a superstição contada por seu pai quando ela era criança, sempre aparecia para todos os artistas talentosos. Ele havia dito que, quando morresse, enviaria a ela o Anjo da Música; pouco tempo depois da sua morte, o suposto Anjo apareceu para ajudá-la a brilhar no palco e a finalmente ter seu talento reconhecido, confirmando a crença da ingênua Christine. No entanto, Raoul percebe que, na verdade, o Anjo da Música e o Fantasma da Ópera, cujo nome real é Erik, são a mesma pessoa, e que Christine corre perigo enquanto estiver envolvida com ele. A partir disso, um triângulo amoroso é formado entre os três.
Apesar de a obra não pertencer ao romantismo, existem claros traços de inspiração. A figura feminina, Christine, é a típica jovem idealizada pelos românticos: ingênua, pura e bela, sempre precisando ser salva por seu amado. Raoul, por sua vez, demonstra o ardor da paixão tão presente em livros do gênero, sendo um rapaz que exalta Christine como sua deusa; seus sentimentos são tão intensos que, por ser novo e imaturo, age de forma impulsiva diversas vezes em prol do amor. Por fim, Erik, o personagem mais importante da obra, é um homem que nasceu com o rosto deformado e que, devido à sua natureza monstruosa, é obrigado a usar sempre uma máscara e se esconde da vista de todos, vivendo nos porões da Ópera de Paris. Embora tenha um talento extraordinário, sua aparência cadavérica assusta as pessoas e as deixam desconfortáveis; por isso, nunca pôde ter a chance de mostrar suas habilidades artísticas para o mundo. Ele se mostra como uma criatura violenta, cheia de ódio contra o mundo e, ao mesmo tempo, melancólica, tendo como único desejo ser amado por alguém. Então, quando conhece a doce Christine, ele enxerga nela uma chance de conhecer o verdadeiro amor, mas se utiliza de meios totalmente inaceitáveis e repugnantes na tentativa de conquistá-la.
Esta é uma narrativa que provoca uma montanha-russa de emoções nos leitores. Mostra a perspectiva de uma pessoa que foi desprezada por todos devido à sua deformação e que nunca foi amada, ainda que fosse extremamente talentosa. Sem conhecer o amor, tudo o que lhe sobra é o ódio. Essa situação pode suscitar uma reflexão em quem está lendo: seria justo sentir repulsa por alguém somente pela sua aparência, sem conhecê-lo de fato? Observa-se, na obra, o uso de um personagem considerado anormal e isolado da sociedade para construir a visão do autor sobre a sociedade. A literatura gótica costuma criticar os padrões sociais através de personagens muitas vezes malignos e/ou que têm um ar de sombrio e de desconhecido, justamente pelo medo que as pessoas sentem de se aproximar. No caso desse romance, a crítica de Leroux seria de que os franceses de sua época viveriam sob uma máscara, buscando o que é belo sem se importarem com o verdadeiro conteúdo de cada indivíduo. Ainda que tenha sido escrito há mais de cem anos, “O fantasma da ópera” é um livro que diz muito sobre a sociedade atual.