Livro: “Movimento 78”, Flavio Izhaki

Por Sabrina Fernandes

Uma palavra pode definir o livro da resenha: confuso. Com mudanças repentinas no ponto de vista dos personagens e até mesmo no tempo em que a narração se passa, o autor cria uma história confusa e difícil de ser imersa, o que dificulta a leitura, tornando-a em certos momentos cansativa.

Isso acontece principalmente com a incessante necessidade de usar o termo “bebê que não é mais bebê”, considerando que se trata de uma construção distópica, acredito que no cenário em que o livro se passa, o termo “criança” não é mais bem-vindo, afinal, que outra explicação teria para o uso do termo citado anteriormente?

Nos últimos anos, mais e mais obras distópicas são criadas, explorando diferentes cenários em que a humanidade pode ou não chegar no futuro. Geralmente, essas são histórias interessantes por natureza, pois constroem um potencial cenário que poderemos viver no futuro, além de trazerem reflexões sobre nossa vida atual que engajam o pensamento crítico e forçam o leitor a pensar sobre o futuro do mundo. Pense em 1984, Laranja Mecânica, e mais recentemente a série da Apple TV, Severance.

No entanto, a obra em questão, “Movimento 78”, acaba sendo superficial. Superficial no sentido de nunca explorar os seus personagens, quem eles são, de onde vieram, por que pensam assim, por que agem de determinada maneira e não de outra. No livro, Kubo, o personagem principal, é apenas um artifício utilizado para criticar a sociedade e o futuro que nos aguarda, porém, sem podermos nos relacionar com o personagem principal, fica difícil se importar com sua vida e o seu destino, que ficamos sabendo logo nas primeiras 30 páginas do livro.

Os outros cenários expostos no livro também envolvem Kubo, ainda que indiretamente, como o ponto de vista de sua esposa que acaba de perdê-lo e agora tem que lidar com novas tecnologias e expectativas do futuro sobre o seu filho. E no futuro, vemos a luta do filho de Kubo que concorre à presidência lado a lado com uma inteligência artificial. 

Acredito que o objetivo do autor com essa história seja alertar sobre as consequências que podemos viver no futuro, em um mundo que está cada vez mais dependendo da tecnologia e da internet. 

Porém, devido ao que eu observo como uma narração superficial, esse ponto acaba não tendo o impacto esperado. Afinal, estamos apenas lendo sobre os potenciais “problemas” que essas tecnologias podem trazer, e muitas vezes nem isso. Por exemplo, podemos deduzir que Kubo morreu devido ao tratamento do câncer precoce, porém, não sabemos se a metodologia usada para educar as crianças da sala de aula do filho de Kubo é algo ruim ou não.

Da mesma forma, é possível que uma inteligência artificial seja de fato um concorrente mais adequado à presidência ao invés de um humano. Um ponto interessante, porém mal explorado, é que aparentemente essas IAs tendem a favorecer empresas, o que realmente pode ser preocupante em um cenário futuro, afinal, nem sempre as empresas têm o bem-estar da população em mente, vide a poluição do meio ambiente e exploração trabalhista.

No entanto, esse ponto nunca é explorado, limitando-se a apenas uma afirmação do candidato à presidência, o que pode ser ou não verdadeiro.

Por fim, acredito que esse livro apresente ideias interessantes, porém mal exploradas, talvez por conta de seu tamanho reduzido não seja possível explorar todos os cenários e personagens apresentados. Enxotar uma narrativa como essa em poucas páginas acaba limitando-a e sente-se a falta de partes da história que a ajudariam a se tornar mais completa. 

Esta resenha faz parte da série Autores da Torre, do Projeto de extensão Torre de Babel, da Biblioteca José de Alencar (Faculdade de Letras/UFRJ) 

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