“Flores para Algernon”, Daniel Keyes

Por Ana Carolina Macedo da Silva

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Do pó viestes, ao pó retornarás

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O livro se trata de uma cirurgia revolucionária que promete aumentar o nível intelectual de jovens com deficiências no intelecto. Charlie Gordon foi selecionado como o primeiro ser humano a passar por esse procedimento cirúrgico. Surpreendentemente a cirurgia é bem sucedida e Charlie ultrapassa as expectativas dos cientistas. A partir disso, Charlie passa a olhar a realidade sob nova ótica, mais crítica, e se questionar a respeito das suas relações sociais.

Bom, como sugere o título, acredito que nada melhor para começar esta resenha do que a passagem de um livro tão importante para a humanidade representando a essência principal, ao meu ver, deste outro que abordarei.

Desde o início do livro a existência de uma divindade superior é questionada, inclusive surge a dúvida, por meio de uma enfermeira, se este ser divino, caso existisse, estaria de acordo com o experimento pelo qual Charlie Gordon seria submetido, uma vez que “Deus nos fez de acordo com a vontade dEle e caso nos quisesse assim e assado teria, assim, nos feito. Não se esqueça de a humanidade ter sido condenada à mortalidade vide ao pecado de Adão e Eva ao comerem do fruto proíbido”, mas enfim será mesmo que a ciência está de acordo com essa premissa?

Bom, a partir de Flores para Algernon, pode-se perceber que a ciência foi capaz — e ainda é, obviamente — de desafiar qualquer aspecto natural do ser humano, com o papel de transformar vidas, assim como transformou a de Charlie. A princípio, a cirurgia experimental foi bem sucedida. O protagonista, aos poucos, foi reconhecendo e abandonando a ingenuidade extrema e dando lugar a um homem arrogante e extremamente inteligente, um gênio. Conseguiu atingir níveis intelectuais extraordinários, absorvendo conhecimento a todo momento e se superando cada vez mais, além de suprir qualquer expectativa dos cientistas a respeito da assertividade do estudo. 

Tudo estava ocorrendo muito bem, até que notam um comportamento errático em Algernon — o primeiro animal em que os experimentos vingaram por um tempo considerável —, como confusões, estresse e agressividade incomuns. Então, a fim de ajudar a descobrir o que estava acontecendo com Algernon e interessado em descobrir como esse comportamento também poderia surgir nele futuramente, Charlie se oferece para estudar o processo e os estudos já realizados pelos médicos e descobre o que há de errado e, logicamente, pressupõe que o mesmo não o tardaria. Desse modo, ele declara que passará o tempo que lhe resta sozinho, aproveitando para registrar o máximo de progresso — ou melhor, regresso — para continuar ajudando na pesquisa. Até que sinais do antigo Charlie voltam a aparecer: dificuldade em lembrar das coisas, complicações na escrita e leitura. A partir daí, o Gênio mostra nuances claras de definhamento neurológico, nos fazendo perceber que o que ele adquirira após a cirurgia fora arrancado naturalmente de maneira tão cruel quanto à maneira que o tratavam antes da operação e, por fim, ao pó Charlie Gordon retornou.

Gordon teve uma vida cruel em todas as fases pela qual perpassou. Antes da cirurgia com a família que não o aceitava como era e dava “corretivos” para que se tornasse normal. Depois da cirurgia, quando o processo ainda era um sucesso, com a dificuldade em se relacionar com as pessoas por conta do seu nível intelectual elevado e por conta das nuances de arrogância. E, por fim, depois da cirurgia, quando o processo começa a falhar, fazendo-o perder gradativamente tudo o que havia conquistado o que, com certeza, foi muito mais doloroso do que quando apenas possuía retardamento, já que ver escapar por entre os dedos o seu objetivo de vida e não poder fazer nada para se livrar disso é, sem dúvidas, agoniante.

Charlie Gordon, portanto, foi apenas um contemplado temporariamente com a dádiva da genialidade que provou do gosto amargo das consequências disso ou uma alma sofredora que desafiou a vontade divina e pagou o preço por isso? 

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