“Carmilla”, Sheridan Le Fanu.

Por Alice Prazeres

Olá, leitores de Babel, como estão? Hoje a indicação vai para os amantes da literatura vampiresca, um clássico e uma das obras mais importantes do gênero, que ajudou a moldar a forma como a cultura pop construiu a imagem dos vampiros. No entanto, não estou falando de Drácula de Bram Stoker. A história que indico hoje é Carmilla, por Sheridan Le Fanu.

Carmilla, um dos primeiros contos europeus sobre vampiros, e o primeiro com uma vampira, narra a história de Laura, uma jovem com uma grande fortuna, porém muito solitária. Morando apenas com seu pai e os criados em um castelo isolado na Estíria, sem irmãs, amigas ou a própria mãe. Ambos aguardam ansiosamente a visita do conde, amigo de seu pai, e sua filha; porém, chegando próximo ao dia da visita, o conde dá a triste notícia de que não poderá mais ir, uma vez que sua filha faleceu em circunstâncias misteriosas.

Antes mesmo de compreenderem a repentina, e infeliz, notícia, essa pequena família encontra uma jovem acompanhada de sua mãe que capotam da carruagem. Sem dar muitas explicações e extremamente eufórica, a mãe suplica para que façam de sua filha hóspede por alguns dias, pois tem uma missão de extrema importância e não pode parar no meio do caminho. Por mais receoso que seu pai fique, Laura fica contente com o pedido e vê ali uma oportunidade de fazer uma nova amizade, já que ela e a jovem têm a mesma idade. Desta forma, seu pai assume essa responsabilidade.

Com o tempo, Laura passa a perceber certos costumes estranhos de sua nova amiga. Ela tem hábitos noturnos, se alimenta pouco, tem um ar envolvente, ao mesmo tempo que depressivo e fantasmagórico. Paralelamente, certos pesadelos e mistérios de sua infância voltam à tona com a presença da nova amiga. É inegável a beleza estonteante de Carmilla, a jovem misteriosa, e seu olhar penetrante que encanta a todos, uma menina muito inteligente e que desperta o interesse daqueles à sua volta. No entanto, o pai e, principalmente, Laura começam a sentir medo e até repulsa, mas também uma admiração pela figura misteriosa. Isso cria uma atmosfera de suspense que culmina na revelação de que Carmilla é, na verdade, uma vampira.

Aliás, esse é um ponto muito controverso na narrativa e que gera debate entre os leitores. Sabemos que para a época, seria praticamente impossível declarar que Carmilla fosse um livro sáfico ou uma qualquer tentativa de representatividade homoafetiva, afinal estamos falando de 1872. Alguns dirão que o autor quis fazer uma imagem de associação negativa tendo como uma das características perversas de Carmilla ser seduzir jovens mulheres, algo extremamente problemático que vemos em obras até hoje. O fato é que nunca saberemos a verdadeira intenção do autor, porém, ao meu ver, temos ensaios de romance e desejo de uma pela outra – mesmo que completamente tóxicos. Afinal, desde os primeiros contos até hoje, os vampiros são descritos como seres sensuais e que usam desse poder carnal para atrair suas possíveis vítimas, e entre Carmilla e Laura não seria diferente — ou seja, sintam-se livres para ler e fanficar.

Um dos poucos defeitos desse livro, para mim, seria o seu tamanho, queria que ele fosse mais longo para ter um desenvolvimento maior tanto da história quanto das personagens. Assim como outros, essa história é mais um exemplo de Penny Dreadful que acabou se tornando um clássico. Carmilla surge para moldar o caráter femme fatale das vampiras e endossar o arquétipo já apresentado em O Vampiro, conto de 1819 escrito por John Polidori na mesma festa em que Mary Shelley escreveu Frankenstein. E vocês, já conheciam o conto? Sabem o que é uma Penny Dreadful? Caso tenha interesse, posso trazer uma resenha de Frankenstein e contar um pouco mais sobre essa festa estranha com gente esquisita.

Esta resenha faz parte da série Autores da Torre, do Projeto de extensão Torre de Babel, da Biblioteca José de Alencar (Faculdade de Letras/UFRJ)