Por Flora Cruz
O segundo livro da coleção “Garotos Mortos”, por Mark Miller, dá continuidade ao primeiro conto – e, aqui, vale lembrar que Garotos Mortos Não Contam Mentiras também é um conto –, dando ao público a oportunidade de ver outro ponto de vista da história.
Sendo mais específica, o segundo ponto de vista que o conto carrega é o de Edgar, pai do protagonista, e só se estende até o fim do primeiro capítulo, no qual os policiais finalmente descobrem que a morte de Alexis foi causada por um assassinato, não suicídio, como previamente acreditavam. A narração do pai de Tommy é muito interessante, em especial porque nos permite entender um pouco sobre o andamento da investigação. Ainda assim, é muito breve e adiciona pouco aos demais fatos ocorridos ao longo do conto, ou seja, apesar de ter sido interessante ter outro ponto de vista, ele próprio e as informações que trouxe não trazem nenhum impacto ao contado no segundo livro da coleção.
Para além de Edgar e seu capítulo, há também o constante uso de nomes americanizados no livro (Tommy, Matt, Eduardo Scooper, etc.), mesmo que a história se passe em São Paulo. É claro que a escolha de nomes surge da necessidade de tornar o livro mais adequado para o mercado literário – que, inclusive, no Brasil, tem pouquíssima força em comparação a inúmeros países europeus -, mas tal fator descaracteriza muito o cenário do livro e tem tom quase que inverossímil.
Após o primeiro capítulo, a história passa a ser narrada única e exclusivamente pelo protagonista. Diante do cansaço de noites mal dormidas, Tommy acaba por ter o rendimento escolar em declínio, o que se torna um grande problema (em especial porque foi presenteado com uma bolsa de estudos) e tudo isso piora quando finalmente consegue falar com Matt e os dois acabam se batendo no meio do pátio da escola.
Como se já não bastasse Matt ignorar as súplicas de Tomas para que ambos conversem, o jogador de basquete arrumou uma falsa namorada, Bárbara, para afastar mais ainda o bolsista e a ideia de que talvez não tenha relacionamentos baseados na heteronormatividade. Se no primeiro conto eu já desprezava Matt, depois desse livro, eu o detesto mais ainda.
E Matt e Tommy precisam muito mais de ajuda psicológica.
Como se não bastasse a conduta terrível do jogador de basquete, piorando toda a situação para o protagonista, o assassino novamente volta a aparecer. Desta vez, com fotos de Matt e Tommy em momentos íntimos, provando que o desconhecido observava os dois antes do crime. Além disso, Tomas vê o melhor amigo de Alexis, Fabian Obalhe, usando o mesmo sobretudo do assassino enquanto saia da escola. Seria ele o assassino do antigo estudante de Eastview?
Diante dessa dúvida (e após uma briga terrível seguida de vários beijos), Tommy e Matt têm a brilhante ideia de que deveriam descobrir juntos quem é a pessoa que os ameaça, partindo da ideia de que Fabian é o principal suspeito e, portanto, deveriam invadir a sua casa. E eu pergunto, caros leitores: por que não? Afinal de contas, dois adolescentes são perfeitamente capazes de desvendar um assassinato sem causar nenhum outro trauma ou morte.
Sinceramente, a autoestima dos adolescentes em histórias infantojuvenis deveria ser vendida por aí.
Com a invasão da casa de Fabian, a narração se torna mais rápida e intensa, acompanhando as emoções do leitor, o que, na verdade, é exatamente o que se espera de um livro investigativo, ainda mais quando há tanto em risco. Apesar das expectativas em relação à procura de novas pistas que incriminem Fabian, logo os meninos descobrem que o suspeito não é o autor do crime e que, na verdade, o sobretudo que usava também foi dado para Alexis. No final das contas, trata-se de uma peça de roupa exclusiva, havendo apenas 5 dela em todo o mundo e 3 das peças estavam em Eastview, ou seja, quem quer que tenha comprado o terceiro casaco o fez na mesma loja.
Findadas as investigações na casa de Obalhe, Tomas volta para sua casa e, para finalizar o conto, encontra seu quarto com fotos do assassinato e do encontro com Matt na casa de Fabian penduradas em sua parede, além de uma mensagem na parede dizendo que o assassino (cuja assinatura é E.V.) estará sempre a um passo à frente deles.
Apesar de ter gostado mais desse conto do que do anterior, ele ainda não tem uma unidade verdadeiramente concisa, me incomodando bastante. Talvez seria melhor se os dois primeiros livros fossem apenas um. De todo modo, o plot continua interessantíssimo e certamente continuarei lendo a coleção. Apenas espero que o próximo livro (que também é um conto) apresente uma unidade bem feita.
Esta resenha faz parte da série Autores da Torre, do Projeto de extensão Torre de Babel, da Biblioteca José de Alencar (Faculdade de Letras/UFRJ)